A chama arde, quase confusa com a luz da rua. Lá fora, a Lua mostra-se timidamente às amigas estrelas, rutilando uma pequena fracção da sua luz àquele quarto. Num misto de sombras e temperaturas altas, há quem se espreguice de aborrecimento e desconforto. A brisa nocturna teima em ficar fora dali, mesmo tendo espaço de sobra para entrar. Naquele momento, ver as cortinas bailarem parece dádiva, ainda que tal aconteça numa dança sobejamente calma e discreta. Ouvem-se suspiros perante aquele quadro. Quase que podia imaginar uma rapariga, elegante e atrevida, a seduzir o rapaz mais giro da discoteca, forçando-o a roçar-se nela enquanto a música se espalhava no ar e o espaço se apertava mais e mais. Até que chegaria à típica melodia dos apaixonados e ele se via, subitamente, com vontade de a puxar para si e desfrutar daquele momento; ali, só os dois, como se a pista se tivesse esvaziado em segundos, e sentindo a pele querer saltar para fora das roupas já cheias um do outro. Mas ele abandona-a, repentinamente, sem dizer palavra, sem olhar para trás.
É aqui que, analogamente, naquele quarto, o vento se solta das garras da cortina persistente e invade, finalmente, a cama suada. Ali está ela, indefesa, agarrada a um quase-sono que a permite sonhar acordada nas horas quentes das noites de um Verão que não esquecerá. No meio de tantos pensamentos, tem tempo para humanizar cortinas e ventos, e torná-los tão íntimos como dois amantes que são nada, um sem o outro. Pressente a angústia soltar-se da jaula, querendo apagar a chama que lhe arde no peito, alimentada apenas por esperança e doces frases vindas de outra boca. Tem medo, mas não desiste. Ele que se atreva, pensa. O Tempo que se atreva. O Destino? Esse que se cuide...
E a chama permanece vivaz.