Há qualquer coisa a bater mais forte do que aquelas badaladas matinais. Oito, nove, dez, diz o relógio de corda. Boa!, pensa, o despertador adormeceu de novo. Espreguiça a vontade de ficar ali e pede licença às pálpebras para encarar o tecto. Lá está ele outra vez. Ri e troça daquele quadro, como quem não aceita a malandrice que ainda se enrosca no corpo da mulher. Ela desvia o olhar e sorri para dentro. Não bastava sonhar contigo... quiseste mais. Levanta a almofada, apoia os pés na cama e afunda as mãos nos cabelos negros da nuca. Tenta amarrar a razão aos suspiros que a consomem. Leva as mãos ao rosto na esperança de despertar para a realidade daquela manhã. Esquadrinha as fronteiras e as linhas desenhadas na pele e imagina-as tocadas pelas mãos daquele sorriso. Sente a chama arder-lhe o peito e ouve as batidas que não pertencem ao relógio. Levanta-se e avança descalça no chão arrefecido pelas orvalhadas da altura.
Ninguém, como tu, me fizera querer
Ir à procura de um sopro no vento…
Vê os versos escritos nos espelhos da casa, sente o tom de voz em qualquer música de amor e apaixona-se pelo leve sotaque que prendeu na memória. É abraçada pela saudade que a empurra para o desalento, mas logo a esperança vem e a sustém. Abre a gaveta, veste-se de azul e voa para o oásis da expressão que acalenta as suas madrugadas... Não quero partir, diz. Leva-me contigo.
1 comentário:
Tive calmamente (tão calmamente como foi possível) a ler os teus textos de cima a baixo. E tornam-se para mim algo irónicos - vou explicar porquê. Apesar de serem simples e aparentemente rápidos de ler, para um leitor mais atento (tipo...eu) escondem aqui e ali pequenos detalhes deliciosos. Preferi andar à procura deles, e só isso deu para os ler uma e outra e outra vez - ler entrelinhas, entenda-se. Gosto do teu estilo porque me faz procurar algo para lá do que está escrito. Parabéns e continua a escrever. Entrelinhas de preferência :)
Ah, decidi comentar este porque puxa para os 5 sentidos do ser humano melhor que outro qualquer. Gostei :)
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